quarta-feira, 20 de abril de 2011

Execução Orçamental, o Novo Instrumento de Propaganda

O Direcção Geral do Orçamento divulgou ontem à noite a Síntese de Execução Orçamental de Março de 2011 (dados até Fevereiro). Como seria de esperar, no início de 2011 esta tem sido uma das peças de informação sobre a evolução das contas do Estado mais esperadas e escrutinadas e, com alguma moderada surpresa, das que têm dado azo às mais bizarras e irregulares formas de difusão e comentário. Aquela que era uma informação que seguia uma divulgação regular e previsível, respeitando um calendário previamente publicado, passou a ser distribuida parcelarmente, erraticamente, ao sabor da agenda política. Sem relevar considerações política-tácticas, o que é certo é que se tem tornado particularmente difícil atender ao essencial.
A leitura do documento é complexa e agravada com a sucessão de quebras de estrutura ao nível da receitas e também das despesas, quer relativos ao ano vigente, quer tendo por referência o ano anterior com o qual compara mais directamente. Há desde logo um aspecto distorcedor que só poderá ser sanado com o fecho definitivo de contas daqui a pouco menos de um ano: este ano o Estado prepara-se para arrecadar mais IRS do que aquele a que terá efectivamente direito (após o apuramento anual) pois existirão retenções mensais excessivas por conta de uma incompleta actualização das tabelas mensais (quando esta ocorreu ao nível das taxas anuais). Em 2012 este excesso de cobrança dará azo a um reembolso. Para já empola as receitas.
Por outro lado, parece também só se ter registado em 2011 a entrada de IRC por conta do pagamento antecipado de dividendos no final de 2011 por parte de algumas grandes empresas (para fugir à tributação mais gravosa de 2011), valores que já estando contabilizados não seguem o padrão normal, ou seja, agora inflacionam as receitas, mas daqui a alguns meses (altura em que habitualmente eram contabilizados) eles não se repetirão, produzindo-se então o efeito inverso ao crescimento homólogo agora detectado.  
Outra situação parecida prende-se com a antecipação de compras no final do ano (por exemplo, automóveis) que numa lógica de caixa se traduzem em entrada de receitas de Imposto Sobre Veículos que é contabilizada em 2011. Se atendermos a que houve antecipação de consumo, podemos facilmente esperar que a receita fiscal se concentrou no início do ano e que no resto do ano haverá uma redução da receita por via de um menor nível de consumo dado que este já foi antecipado… Mas muito mais haveria para dizer.
Em suma, a execução está a correr bem ou mal? É difícil dizer… E vai melhorar ou piorar? Mais difícil ainda!
Artigo publicado no blog: Economia e Finanças, por Mapari em 18/03/2011

Economia e Finanças

sábado, 16 de abril de 2011

"OS VERDADEIROS FACTOS DA CAMPANHA" - Post do Professor Álvaro S. Pereira

O professor Álvaro Santos Pereira (Universidade de Vancouver, Canadá) colocou ontem no seu blogue "Desmitos" um post que é obrigatório ler para perceber o que devíamos estar a discutir na campanha eleitoral. Aqui fica a reprodução:
Nos últimos dias, a "campanha" eleitoral tem sido constituida por um rol de "factos" que só servem para distrair os(as) portugueses(as) daquilo que realmente é essencial. E o que é essencial são os factos. E os factos são indesmentíveis. Não há argumentos que resistam aos arrasadores factos que este governos nos lega. E para quem não sabe, e como demonstro no meu novo livro, os factos que realmente interessam são os seguintes:
1) Na última década, Portugal teve o pior crescimento económico dos últimos 90 anos
2) Temos a pior dívida pública (em % do PIB) dos últimos 160 anos. A dívida pública este ano vai rondar os 100% do PIB
3) Esta dívida pública histórica não inclui as dívidas das empresas públicas (mais 25% do PIB nacional)
4) Esta dívida pública sem precedentes não inclui os 60 mil milhões de euros das PPPs (35% do PIB adicionais), que foram utilizadas pelos nosso governantes para fazer obra (auto-estradas, hospitais, etc.) enquanto se adiava o seu pagamento para os próximos governos e as gerações futuras. As escolas também foram construídas a crédito.
5) Temos a pior taxa de desemprego dos últimos 90 anos (desde que há registos). Em 2005, a taxa de desemprego era de 6,6%. Em 2011, a taxa de desemprego chegou aos 11,1% e continua a aumentar. 
6) Temos 620 mil desempregados, dos quais mais de 300 mil estão desempregados há mais de 12 meses
7) Temos a maior dívida externa dos últimos 120 anos. 
8) A nossa dívida externa bruta é quase 8 vezes maior do que as nossas exportações
9) Estamos no top 10 dos países mais endividados do mundo em praticamente todos os indicadores possíveis
10) A nossa dívida externa bruta em 1995 era inferior a 40% do PIB. Hoje é de 230% do PIB
11) A nossa dívida externa líquida em 1995 era de 10% do PIB. Hoje é de quase 110% do PIB
12) As dívidas das famílias são cerca de 100% do PIB e 135% do rendimento disponível
13) As dívidas das empresas são equivalente a 150% do PIB
14) Cerca de 50% de todo endividamento nacional deve-se, directa ou indirectamente, ao nosso Estado
15) Temos a segunda maior vaga de emigração dos últimos 160 anos
16) Temos a segunda maior fuga de cérebros de toda a OCDE
17) Temos a pior taxa de poupança dos últimos 50 anos
18) Nos últimos 10 anos, tivemos défices da balança corrente que rondaram entre os 8% e os 10% do PIB
19) Há 1,6 milhões de casos pendentes nos tribunais civis. Em 1995, havia 630 mil. Portugal é ainda um dos países que mais gasta com os tribunais por habitante na Europa
20) Temos a terceira pior taxa de abandono escolar de toda a OCDE (só melhor do que o México e a Turquia)
21) Temos um Estado desproporcionado para o nosso país, um Estado cujo peso já ultrapassa os 50% do PIB 
22) As entidades e organismos públicos contam-se aos milhares. Há 349 Institutos Públicos, 87 Direcções Regionais, 68 Direcções-Gerais, 25 Estruturas de Missões, 100 Estruturas Atípicas, 10 Entidades Administrativas Independentes, 2 Forças de Segurança, 8 entidades e sub-entidades das Forças Armadas, 3 Entidades Empresariais regionais, 6 Gabinetes, 1 Gabinete do Primeiro Ministro, 16 Gabinetes de Ministros, 38 Gabinetes de Secretários de Estado, 15 Gabinetes dos Secretários Regionais, 2 Gabinetes do Presidente Regional, 2 Gabinetes da Vice-Presidência dos Governos Regionais, 18 Governos Civis, 2 Áreas Metropolitanas, 9 Inspecções Regionais, 16 Inspecções-Gerais, 31 Órgãos Consultivos, 350 Órgãos Independentes (tribunais e afins), 17 Secretarias-Gerais, 17 Serviços de Apoio, 2 Gabinetes dos Representantes da República nas regiões autónomas, e ainda 308 Câmaras Municipais, 4260 Juntas de Freguesias. Há ainda as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, e as Comunidades Inter-Municipais.
22) Nos últimos anos, nada foi feito para cortar neste Estado omnipresente e despesista, embora já se cortaram salários, já se subiram impostos, já se reduziram pensões e já se impuseram vários pacotes de austeridade aos portugueses. O Estado tem ficado imune à austeridade

Isto não é política. São factos. Factos que andámos a negar durante anos até chegarmos a esta lamentável situação. Ora, se tomarmos em linha de conta estes factos, interessa perguntar: como é que foi possível chegar a esta situação? O que é que aconteceu entre 1995 e 2011 para termos passado termos de "bom aluno" da UE a um exemplo que toda a gente quer evitar? O que é que ocorreu entre 1995 e 2011 para termos transformado tanto o nosso país? Quem conduziu o país quase à insolvência? Quem nada fez para contrariar o excessivo endividamento do país? Quem contribuiu de sobremaneira para o mesmo endividamento com obras públicas de rentabilidade muito duvidosa? Quem fomentou o endividamento com um despesismo atroz? Quem tentou (e tenta) encobrir a triste realidade económica do país com manobras de propaganda e com manipulações de factos? As respostas a questas questões são fáceis de dar, ou, pelo menos, deviam ser. Só não vê quem não quer mesmo ver.
A verdade é que estes factos são obviamente arrasadores e indesmentíveis. Factos irrefutáveis. Factos que, por isso, deviam ser repetidos até à exaustão até que todos nós nos consciencializássemos da gravidade da situação actual. Estes é que deviam ser os verdadeiros factos da campanha eleitoral. As distracções dos últimos dias só servem para desviar as atenções daquilo que é realmente importante.

Álvaro Santos Pereira

terça-feira, 5 de abril de 2011

Movimento "Mais Sociedade"

No passado Sábado, dia 2 de Abril, decorreu, no Porto, o primeiro encontro da iniciativa “Mais Sociedade”, subordinado ao tema “Uma visão para Portugal”.
“Mais Sociedade é uma iniciativa da Sociedade Civil que tem como objectivo promover uma discussão aberta sobre o Futuro de Portugal.
Contando com a participação de pessoas que representam um leque alargado de opções políticas, actividades profissionais, formações académicas e gerações,  Mais Sociedade visa a apresentação de propostas concretas e integradas que possam vir a ser consideradas em futuros projectos e programas políticos.
Aberta e independente, tendo por base a convicção de que cada português é parte activa num projecto concreto de mudança, esta iniciativa lança um desafio a todos os cidadãos seja qual for a sua ideologia política.
Cidadãos empenhados em exercer uma cidadania activa e que podem participar intervindo de forma independente, expressando as suas opiniões livremente, em propostas bem fundamentadas.
“Portugal faz-se consigo” dá o tom a uma iniciativa que pretende valorizar a sociedade e o contributo de cada um na construção de um Portugal Melhor e com Mais Futuro.”

A abertura dos trabalhos deu-se com intervenção do Dr. António Carrapatoso – à qual, infelizmente, não tive oportunidade de assistir.
O quadro de oradores era de extrema valia: o neurocirurgião, João Lobo Antunes, o sociólogo, Manuel Villaverde Cabral, o historiador, Rui Ramos e o economista, Vitor Bento. O encerramento ficou a cargo de Pedro Passos Coelho, líder do PSD.
As intervenções foram todas, ineludivelmente, desaguar no mar tempestuoso que a sociedade portuguesa enfrenta.

Para Manuel Villaverde Cabral, a ideia chave para a resolução do actual cenário, de caos económico e social, é a “equidade”.  Urge uma rápida reforma do “Estado-Providência” e o abandono de conceitos abstractos, tais como, “Estado, Sociedade, Liberalismo…”
“A ligação entre eleito e os seus representados deve ser repensada” – começando por alterar o actual sistema eleitoral, acrescento eu –, pois, “já foi maior e agora é menor”.
Para Villaverde Cabral, deve prestar-se atenção a outros factores – baixa natalidade, envelhecimento, fenómenos migratórios - que, inevitavelmente, terão influência directa na arquitectura, actual, da sociedade portuguesa. Atenção que, em sua opinião, deve ser aplicada na alteração nos procedimentos de participação cívica.
O historiador, Rui Ramos, salientou a história de resiliência que, um pequeno país como Portugal, já deu mostras de ter. Lembrou Herculano e Jaime cortesão e as suas contribuições que deram para que Portugal ultrapassasse desafios, então, impostos.
Para Rui Ramos, o que nos impede de mudar e avançar é o “Medo”.
Para Vitor Bento, ao Estado cabe a tarefa de assegurar que a energia criativa e os direitos individuais sejam salvaguardados. Deve evitar o planeamento. Vitor Bento não acredita em “Sociedades perfeitas”.
Portugal, segundo este economista, possui recursos naturais e humanos em grande número, o seu problema é “falta de capacidade de realização”. Deve haver um maior empenho na “Cultura”. A “Decência” deve estar sempre presente, porquanto é dessa forma que se gera “Confiança”.
“Há muitos sinais de esgotamento [do sistema político], mas há poucos sinais de auto-regeneração”. O sistema político deve estar assente em “instituições credíveis e sérias”, afirma. O “Estado é demasiado grande e [por isso] demasiado fraco”. É um “Estado forte com os fracos e fraco com os fortes”. “É [Estado] uma coutada dos aparelhos partidários”.
“A redução do Estado”, segundo Vitor Bento, “não significa reduzir as suas funções”. Pelo contrário. “Concentrando-se nas suas funções essenciais, torna-se mais forte”.
Vitor Bento terminou a sua intervenção, fornecendo “cinco propostas” para ajudar a ultrapassar o difícil momento que atravessamos.
A primeira tem a ver com o fortalecimento do Estado, promovendo a equidade e a justiça. A nomeação e os mandatos devem ser alvo de um painel de avaliadores – é a segunda proposta.Limitar a utilização dos regimes legais de excepção, a terceira – em que a Lei de Ordenamento do Território é o exemplo. E, por último, a transparência do Estado em relação aos interesses particulares.

Foi uma sessão recheada de contribuições que, em bom rigor, podem contribuir como tiro de partida para a nossa participação na busca de respostas para os desafios actuais e futuros de Portugal.
Se acha que pode dar um contributo, visite: http://www.maissociedade.com/areas-tematicas/